Muito se tem falado sobre a subida dos juros desde Junho de 2022, altura em que o BCE (Banco Central Europeu) iniciou um ciclo de subidas que poucos esperavam. Nos próximos parágrafos, vou tentar simplificar conceitos de que muito temos falado, mas que não nos ensinam na escola: considero portanto normal que, quando somos invadidos por manchetes sensacionalistas na televisão, nos jornais e transversalmente na comunicação social, se gere em nós um sentimento de pânico ou preocupação, quer com a economia no seu todo, quer, em especifico com o nosso crédito habitação.
Ao longo do tempo, no dia-a-dia do trabalho, sou muitas vezes questionado pelos clientes que a mim recorrem com o intuito de melhorar a sua condição financeira – já me perguntaram até quando é que os juros iam subir, qual será o novo normal, se a subida dos juros afeta apenas as pessoas com credito habitação, se os preços das casas vão parar de subir, qual é o impacto que esta situação terá no mercado de arrendamento, e principalmente, o que podem fazer para melhorar a sua liquidez mensal.
Antes de falar das respostas, penso que importa contextualizar e enquadrar toda esta situação, e vou tentar fazê-lo de forma pragmática:
- Taxas de juro negativas não são normais: Vínhamos de um período histórico de taxas de juro negativas, já há muito se falava da possível subida da Euribor e sabemos que o BCE pretendia inflações na ordem dos 2%, com taxas de juro a acompanhar esses valores.
- Os últimos anos não foram fáceis. A crise pandémica pelo COVID19 causou um choque de tamanhas dimensões que levou a a que se tomassem algumas decisões, na altura, necessárias. A guerra na Ucrânia também fez a sua parte, e o facto é que nos últimos 3 anos tivemos a junção de 2 factores que considero importantes nesta situação. Por um lado, a injecção de dinheiro novo na economia, por outro a interrupção de cadeias de fornecimento (durante o COVID e agora com a situação com a guerra), o que somando a outros factores levou a que se começasse a sentir a inflação a subir de forma descontrolada.
- Para controlar a inflação, uma das ferramentas de que o BCE dispõe, é a subida dos juros;
- O que é a tão falada inflação ? A inflação é o aumento do preço dos bens e serviços. É medida por “um cabaz” de artigos seleccionados, em que são comparados os preços em duas datas distintas. Significa desvalorização do dinheiro, significa que os mesmos 1000€ de hoje, daqui a um ano valem menos.
- O papel do BCE é manter os preços estáveis na Zona Euro, daí que tenha que agir em determinados momentos com políticas das quais podemos concordar ou discordar, mas que têm como objetivo a estabilidade da moeda.
- A Euribor é, explicada de forma muito arcaica, a média da taxa de juro a que alguns bancos da Zona Euro negoceiam entre si, num prazo especifico.
- A Euribor é a taxa utilizada em Portugal para indexar os créditos habitação.
- A Euribor tem vários prazos, e os valores variam diariamente. A média dos valores de um determinado mês representa o valor de referência para o mês seguinte.
- A subida da Euribor era expectável, mas não tão abruptamente como aconteceu.
Partindo desta informação, quero também esclarecer alguns conceitos relativamente ao crédito habitação, porque é aqui começam as siglas e os palavrões que a maioria de nós não sabe o que quer dizer:
- TAN: Taxa Anual Nominal – é a taxa a que são cobrados os juros dos empréstimos. No caso de um crédito habitação a taxa fixa, a TAN é o valor da taxa fixa, no caso da taxa variável, corresponde ao valor da Euribor pelo prazo escolhido, acrescido do spread;
- SPREAD: Segundo o Banco de Portugal (BdP) é “uma componente da taxa de juro, definida pelo banco, contrato a contrato, quando concede um empréstimo”. Podemos descomplicar e dizer é a margem de lucro do banco quando empresta dinheiro.
- TAEG: Taxa Anual de encargos Efetiva Global – mede o custo do empréstimo para o cliente, por ano, em percentagem do montante emprestado. Isto é, ****é o indicador que inclui os juros, as comissões, as depesas e encargos com o empréstimo, e outros encargos associados ao crédito. Diferencia-se da TAN por incluir, não só o juro do empréstimo, mas todos os outros encargos cobrados ao consumidor;
- MTIC: Montante Total Imputado ao Consumidor – é o valor final que vamos pagar pelos encargos associados ao crédito: inclui o montante emprestado, os juros, as comissões, impostos e seguros – em empréstimos indexados a uma taxa de juro variável ou em regime de taxa mista (um período de taxa fixa + um período de taxa variável), o MTIC pode variar e como tal é apenas indicativo.
Estas informações constam obrigatoriamente da FINE (ou FIN) que são as Fichas de Informação Normalizadas e são documentos obrigatoriamente disponibilizados pelo banco ou instituição financeira ao consumidor. E aqui surge outra questão pertinente: a maioria de nós ao contratar um crédito habitação passou os olhos por este documento, leu meio na diagonal, e assinou, sem perceber muito bem o que para lá estava. (Se não é o seu caso, ainda bem!) Este processo pode ser confuso, com pouco esclarecimento para o consumidor e então é aqui que entra o intermediário de crédito, figura criada pelo legislador em 2018, que tem o dever de obter soluções nos vários parceiros com que trabalha, de as apresentar de forma independente ao consumidor e dar-lhe a informação de que necessita para a tomada de decisão mais ajustada ao seu caso.
Voltando ao tema do artigo, o intermediário de crédito deve ajudar as pessoas a fazer face a esta subida dos juros com uma análise a cada caso em particular. Cada caso é um caso, mas deve ser analisado o cenário actual e o cenário possível tendo em conta a oferta de soluções e produtos da banca. À data em que é escrito este artigo, existem bancos com produtos com spreads tão baixos como 0,5% ou 0%, existem soluções de taxa fixa ou mista inferiores à taxa de juro que algumas pessoas estão actualmente a pagar pelos seus empréstimos e, como neste momento, estão ainda a decorrer campanhas de transferência de crédito (transferir o seu empréstimo de um banco para outro) em que as próprias instituições bancárias estão a assumir os custos (em forma de isenção ou reembolso) na totalidade.
Não querendo discutir se a subida dos juros é a solução de que precisamos ou não para a economia, porque para isso temos os economistas, é dado adquirido que é nesta situação que nos encontramos – o que deixou muitas famílias em situações menos confortáveis do que a de há ano e meio atrás.
Ninguém pode afirmar com certeza até quando os juros vão subir, ou em que valor vão estabilizar, quanto tempo vão demorar a descer e até que valor vão parar de descer, as próprias análises macro-económicas mais recentes de vários especialistas são diferentes das análises do inicio do ano. No entanto, e após uma subida de cerca de 4% em pouco mais de um ano, a opinião dos especialistas parece convergir para indicar que estamos perto do pico desta subida – o desenvolvimento daqui para a frente, vai depender sempre do desempenho da economia global, sendo que o esperado, correndo tudo bem, seja o inicio de uma descida “a conta-gotas”. Arrisco-me também a dizer que taxas de juro negativas, caso volte a acontecer, será muito mau sinal – economia colapsada com essa necessidade para que se volte a movimentar: A menos que ocorra uma invasão extra-terrestre, parece-me pouco provável esse cenário…
Seguindo a lei da oferta e da procura, e juntando o facto do dinheiro mais caro, parece-me também que este conjunto de situações não afeta apenas quem é detentor de um crédito habitação – o arrendamento também sofre. Até quando? Quão bom seria termos uma solução mágica para este desafio? Fala-se numa estabilização de preços, numa possível quebra em alguns sítios específicos do país, que pode até já estar a acontecer – mas não na ordem de grandeza de que os compradores gostariam, mas deixarei este tema para um próximo artigo…
Com o optimismo de que o ser humano é resiliente e que se adapta a qualquer situação, estamos a atravessar uma período de adaptação a vários níveis: Os bens e serviços estão mais caros, a habitação está mais cara e o dinheiro em si está mais caro. Cabe-nos capacitar-nos dos recursos que nos permitam analisar e decidir melhor o que fazer com o nosso dinheiro, de maneira a que possamos melhorar a nossa liquidez todos os meses.
Daniel Baptista
DS IMOBILIÁRIA BARREIRO
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